A expansão das cracolândias e a derrota do Estado
Se mantivermos os mesmos
conceitos em relação ao uso e consumo de "drogas" não avançaremos, ao
contrário, entregaremos a sociedade à esperteza inescrupulosa do tráfico que,
numa dinâmica em busca de novos "clientes", prepara drogas cada vez
mais viciantes e dilaceradoras. Todos os índices demonstram que o Estado está
indo na direção contrária em relação aos usuários, com politicas conservadoras
e completamente ineficientes.
Espalhar usuários como
foi feito em São Paulo, foi “o tiro no pé” que o Estado deu em si mesmo. Houve
um aumento considerável do numero de usuários de crack, agora, em pequenos
guetos, espalhados por toda cidade, levando para vários bairros a complexa rede
de conflitos psicosociais que se move em função da dependência química.
A intervenção na cracolândia, que não passou
de uma prática higienista do Estado em nome de interesses privados ligados a
especulação imobiliária, visto que, segundo pesquisas da Universidade Federal
de São Paulo, apenas um em cada três usuários de crack, recebeu oferta de
tratamento e o consumo elevou-se em 25%. Agora, novas substâncias são
comercializadas pelo tráfico, como por exemplo, uma mistura de maconha com
crack, denominada de “Zirrê”, sendo essa, difundida nas mais variadas camadas
sociais. A estratégia do tráfico é atingir pessoas de poder aquisitivo elevado
através dessa mistura, para, logo mais, levá-las a migrar definitivamente para
a “pedra pura”.
Diante da estratégia do abominável tráfico,
o Estado, caso mantenha-se nessa postura conservadora, ineficiente e limitada
estabelecerá um vil acordo com o fracasso, expondo toda sociedade em virtude da
ausência de políticas públicas transformadoras.
Não se enganem, o modelo que hoje temos é
um forte aliado do tráfico, afinal, esse último, tem uma imensa capacidade de
uma dinâmica muito veloz em adequar-se às suas finalidades, entre elas,
enriquecer as custas do adoecimento social.
Não me canso de falar, em bater às portas
dos gabinetes apresentando projetos preventivos, mesmo sabendo da falta de
interesses, ou, então, algumas vezes, da curiosidade dissimulada, afinal,
projetos como esses não geram grandes lucros as estruturas de uma rede de poder
corrupta comprometida com interesses privados, aliás, o coletivo está em último
plano, exposto às vistas grossas em relação ao que deveria ser o caminho de uma
verdadeira transformação social.
O que temos são campanhas de baixa
abrangência, e claro, não poderiam faltar valores altíssimos em verbas ao município
de São Paulo, sendo que, dia 18 de janeiro de 2012, o governo federal liberou
um montante de 3, 2 milhões e, no segundo semestre desse mesmo ano, que, por
sinal, se finda com baixos resultados, mais 3,2 milhões. Até 2014, estão
previstos investimentos de 500 milhões de reais, apenas para São Paulo, e em
todo Brasil, serão disponibilizados 4 bilhões de reais.
É preocupante? Sim, muito! De 6 milhões e
400 mil reais foram investidos nessa área na cidade de São Paulo. Agora me digam
como esteve essa cidade nesse presente ano?
Façam uma análise, sozinhos, ao final, nem
me contem; não quero aqui, tornar o que eu penso um parâmetro para quem quer
que seja, apenas, manifesto um pensamento muito pertinente à minha profissão, e
muito mais, por eu ser pai, avô, tio e conviver com centenas de adolescentes do
ensino fundamental.
Não podemos mensurar as consequências
advindas do uso do crack, mas, já assistimos a um avant premier, bem estarrecedor.
Quando nos recordamos que a mais de 20 anos
atrás, profissionais de vários segmentos, saúde mental, educação, sociologia,
assistência social, filosofia e jornalismo já alertavam quanto às gravíssimas
consequências em virtude dessa substância psicoativa (“drogra”) tão
fragmentadora. Se as politicas preventivas tivessem sido implantadas, nossa
realidade hoje poderia ser bem melhor.
E agora, são 4 bilhões de reais, investidos
em campo minado, e pelo que vimos, de 6 milhões de reais, investidos na cidade de
São Paulo, não foram, até o presente momento, capazes em comprar nossas
consciências e nossa capacidade em interpretar, analisar e concluir que o Estado, lamentavelmente,
nesse ano, foi derrotado por essa grave questão psicosocial, o crack. Não posso
sequer falar bem feito, vontade não falta, justamente, por ainda continuar
ineficiente, moroso, completamente confuso e adoecido pelos esquemas de
corrupção existentes, mas, quando nos deparamos com cada dependente que vemos
pelas madrugadas, caminhando em direção a lugar nenhum, todo ódio se desfaz
para prevalecer o acolhimento que devemos oferecer a esse grave momento que
vive toda a sociedade.
Marcus Fleury Junior é psicólogo e
coordenador do Ateliê de Inteligência.
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