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quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

Viktor Frankl: Quando uma rosa é arremessada.



Quando uma rosa é arremessada, suas pétalas sempre encontram o destino relacionado à pretensão daquele que a lançou e, conseqüentemente, esse movimento quebra o excessivo investimento que tendemos a fazer em nós mesmos, trazendo formas de felicidade e prazer.

Viktor Frankl, psiquiatra austríaco, conheceu o triunfo e o declínio, para que, depois de vários anos, pudesse revestir-se de orgulho, entretanto, teve que desfazer-se do egocentrismo adoecedor, desinvestindo-se do olhar que, muitas vezes, por ser obsessivamente voltado para dentro de si, acaba por não enxergar o universo que podemos criar, tornando-nos apenas uma minúscula parte adoecida por sermos tão centralizadores e compulsivamente íntimos das ilusões, quando acreditamos sermos alguma coisa, sem nada sermos, a não ser, o nosso próprio e maior incômodo.

Já parou para pensar que sua arrogância revela o horror interno que você criou nesse “bunker” ao qual chama de corpo? Esse abrigo em que se esconde e onde transforma o stress no desencadeador de tantas outras doenças, e isso, nada mais é, senão, uma forma em punir a si mesmo, sentenciando-se a depressão, ao pânico e a outros transtornos, por acreditar que você pode controlar tudo, desde que afogue-se em si mesmo e, abandonando o sentido que tem faltado a existência humana. Posso lhe fazer uma pergunta? Mas, posso mesmo? Então ta, farei, desde que você pare por um segundo, deite o jornal sobre a mesa e dê uma olhada contemplativa para o céu e para a pessoa que estiver ao seu lado e faça-se a seguinte pergunta: Qual o sentido que você tem dado para a vida? Agora, tenha liberdade em perguntar para a pessoa mais próxima e a ouça. Outra pergunta: Quais são seus porquês? Afinal, somos capazes de suportar todas as situações, desde que não percamos o sentido e o significado que trazemos para a vida.

Frankl, sua esposa, seu pai, irmão e irmã viram-se, do dia para noite, arremessados pelo inferno nazista em campos de concentração, separados pelo ódio de Adolf Hitler, marcados a ferro quente. Ele era o prisioneiro 119.104, movido não pelos “como?”, entretanto, pelos “porquês?”, ou melhor, pelos sentidos que encontrou na aniquiladora “fábrica da morte”, da qual saíram vivos, dentre toda a sua família, somente ele e sua irmã. Ao ser lançado no primeiro campo de concentração, pois, passou por vários, inclusive os de Theresientadt e Auschwitz, submetido a fome, ao frio e as maiores agruras possíveis, foi imediatamente submetido aos procedimentos sádicos de elevada humilhação e obrigado a trocar o terno que usava pelo com “pijama listrado”. Havia na calça do terno uma caderneta com anotações que vinha a algum tempo fazendo, objetivado a transformar os dados colhidos em livro, entretanto, perdeu todo conteúdo de seu trabalho. Ao vestir a calça do pijama listrado, sentiu que havia algo em seu bolso, enfiando a mão e retirando um pedaço de papel, deparou-se com a principal oração do Judaismo. Estava escrito: “Shema Yisrael Adonai Elohênu Adonai Echad (Ouve ó Yisrael, Adonai é nosso D-us, Adonai é Um”. Aquilo o emocionou profundamente, afinal, sendo Judeu, sabia da importância de suas convicções e da relação com o Eterno, então, resolveu perguntar aos outros presos quem havia vestido aquele pijama, ficando sabendo que fora, até o dia anterior, vestido por um Rabino que tinha sido morto na câmara de gás.

Por esse motivo e tantos outros que já pude contemplar nessa existência, concluo  frente a muitas situações, acreditando que, quando uma rosa é arremessada, suas pétalas sempre encontram o destino relacionado à pretensão daquele que a lançou. A oração no pijama que Frankl vestiu foi a rosa lançada, cujas pétalas, a oração, geraram diversos insigts, levando a encontrar e dar sentido a sua dor, bem como, em suas conversas com seus companheiros de campo de concentração, buscando levá-los a pensar no sentido e nos significados existentes que poderiam dar, trazendo, dessa forma, o único ingrediente que deixou muitos vivos, o resgate da esperança, fazendo-os pensar e falar, trazendo significado e construindo o sentido, principalmente quando não nos resta mais nada, quando somos abruptamente destituídos daquilo que imaginávamos ou fingíamos não acreditar que poderia tornar-se o caos. Quantas vezes o caos está instaurado e não nos permitimos assumir as ruínas que restaram? O melhor é que, depois de um tempo, aprendemos que essas ruínas serão os alicerces para que nos reconstruamos, tornado a existência um palco onde encenamos as nossas histórias e as vivemos, não mais assentados na platéia, como espectadores de nossas experiências, afinal, se estamos vivos, é natural e perfeitamente compreensível que todos, sem excessão, passarão por momentos difíceis, por perdas, por traumas, por frustrações, mas que, diante cada circunstância, tornamo-nos muito melhores e aptos a olhar a vida de frente, entendendo que felicidade não é uma obrigação ou promessa, entretanto, uma conseqüência daquilo que fazemos.

Viktor Frankl, concluiu em toda sua trajetória em Auschwitz que, “a experiência mais elevada para o homem que regressa ao seu lar, é a maravilhosa sensação que, após tudo que ele sofre, não há mais nada que precise temer, exceto seu D-us”.

Marcus Antonio Britto de Fleury Junior é psicólogo, coordenador do programa de prevenção a depressão e do Grupo de estudo Michel Foucault do Ateliê de Inteligência.

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