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sábado, 10 de dezembro de 2011

Acolher sim; recolher , nunca !








Ao tomarmos conhecimento das intenções e propostas estruturadas pelo Programa de Enfrentamento do crack, parte 2, nos deparamos, mais uma vez, com o retrocesso permeado por dissimuladas intenções quanto a imposição, às custas de 4 bilhões de reais, de políticas que não podem ser consideradas de enfrentamento, mas, de recolhimento, subserviência e acordo com as antigas práticas, onde, lançam seres humanos para detrás de muralhas da vergonha, que, ainda hoje, existem em diversas regiões de nosso país.
Basta que recorramos à memória, não de tempos remotos, mas que, na atualidade, nos causam profunda indignação.

Em Sorocaba, S.P, em menos de três anos, morreram 459 pessoas dentro dos manicômios. Isso, nos anos de 2006 a 2009, registrando um índice de óbitos elevadíssimo, totalizando 16,5 para cada 100 leitos.

Não podemos confundir atendimentos e intervenções psiquiátricas sérias, honestas e atualizadas, a condutas que, nos dias atuais, por mais grave que sejam as questões, exponham o ser humano a condições tão destruidoras quanto às práticas que somam mais de 300.000 mortes em manicômios. Trezentas mil pessoas. Esse é o numero que incomoda, não apenas quem luta por uma sociedade desprovida de manicômios, mas, àqueles, que, dentro de suas convicções, ainda exaltam-se, ensoberbecendo-se por seus títulos que, nada valem, se não houver sabedoria e capacidade de interpretação dos fenômenos sociais.

Inteligência desprovida de sabedoria, não passa de esperteza, ou, nos casos mais crônicos, péssimas intenções travestidas por chancelas e outros recursos midiáticos academicistas e elevadamente narcisistas.

Portanto, se não houver a estruturação de condições que possibilitem atendimentos e tratamentos dignos, nossos dependentes químicos, já aprisionados em seus próprios corpos, serão, mais uma vez, lançados após o arbitrário recolhimento a depositários humanos, locais estes, que escondem a miséria biopsicossocial, em favor da dissimulada aparência do Estado, entorpecido pelas doses ilusórias de meias-medidas que favorecem apenas a pequenos grupos ensandecidos pelo discurso da loucura e pela grande aversão às diferenças.

O Estado rendeu-se à pressão dos conservadores que, há muito, empenham-se em atribuir toda mazela social a determinadas pessoas que, organizam-se em grupos para não desintegrarem-se, na dilacerante invisibilidade de uma estrutura que transforma, de acordo com seus interesses, o caos social produzido pela corrupção e ineficácia, em eficientes métodos para poderem perpetuar velhas práticas de como extorquir lucros a partir do sofrimento humano.

O psiquiatra e escritor Edmar Oliveira, ex-diretor do Instituo Nise da Silveira, assim define:
“Estamos assistindo ao desmonte de um conjunto de políticas modernas e revolucionárias na área da Saúde Mental e a reimplantação de um modelo cruel e historicamente falido. Vamos olhar a questão por uma lente grande angular: Setores hipócritas da sociedade, uma mídia alarmista e políticas públicas equivocadas (quando não intencionais), estão usando o crack para criminalizar a pobreza e atacar os bolsões de populações em situação de vulnerabilidade com o eufemismo do “acolhimento involuntário”. Construção inconciliável, que nós, os que trabalhamos no campo da Saúde Mental, sabemos ser falsa. Ou o acolhimento é voluntário ou, se involuntário, aí não é mais acolhimento, e sim recolhimento.”
As políticas de saúde mental que vieram para humanizar as relações entre o sofrimento humano e o caos social, estão, mais uma vez, sujeitas ao toque perverso dos manicômios, sendo a internação involuntária, o mecanismo que atende aos seus interesses, excluindo a pessoa humana do seu espaço social e remetendo-a ao cerceamento e opressão.

Assim define o Psiquiatra Edmar Oliveira: “Assistir ao desmantelamento das políticas complexas que ainda estavam em ritmo de implantação, para a recuperação de um modelo já condenado no século passado, é um martírio que os militantes da construção da Reforma Psiquiátrica estão vivendo. A Reforma Psiquiátrica é um movimento que implantou dispositivos comunitários de Saúde Mental, reduzindo, consideravelmente, o uso do hospital psiquiátrico especializado. E pior é saber que o modelo da internação (na contramão da Reforma), proposto atualmente, condena à exclusão intencional (em nome do tratamento), populações vulneráveis que sofrem da epidemia de abandono social. E para as quais, haveriam de ser implantadas políticas públicas sociais, educacionais, habitacionais e de emprego, propondo a inclusão dessas pessoas que ficaram para trás, no apressamento competitivo dessa sociedade.”

Fico pensando que finalidades darão às redes substitutivas, se em relação aos consultórios de rua, diante desse programa de enfrentamento ao Crack (parte 2), o transformaram num mecanismo de investigação e controle das condições dos usuários, com o objetivo em definir quem deve ou não ser submetido a internação voluntária.
Isso é uma farsa empírica e um engodo para ludibriar a opinião pública, que confunde ausência de segurança pública a ineficazes políticas públicas de saúde mental.
Os consultórios de rua no Brasil, surgiram em Salvador, no final da década de 1990, visando atender pessoas expostas à vulnerabilidade social, sendo elas crianças, adolescentes e usuários de álcool e outras substâncias, entre elas, o crack, mantendo os mesmos princípios da ONG francesa, “Médicos do Mundo”, (1980), cuja proposta é “lutar contra todas as doenças até mesmo a injustiça”.

Os consultórios de rua são formados por médicos, psiquiatras, psicólogos, enfermeiros, nutricionistas, pedagogos, sociólogos e filósofos com suporte em um ambulatório móvel, promovendo estudos e devidos levantamentos que buscam compreender onde estão as áreas de concentração social que abrigam esse grupo de pessoas que necessitam de suporte e acolhimento, para, em seguida, definir estratégias de atuação que visem uma aproximação, estruturando assim, elos de confiança.

O que estamos assistindo, redundará na forma sutil da concretização dos intentos daqueles que tanto trabalharam contra um novo modelo de saúde mental no Brasil, trazendo de volta os velhos estigmas e preconceitos, estabelecendo em relação à loucura, o estereótipo limitante que deforma e furta possibilidades de convivência social.

Marcus Antonio Britto de Fleury Junior, Psicólogo e um dos coordenadores do Ateliê de Inteligência e do Programa preventivo e resignificativo, dirigido a crianças e adolescentes no cotidiano escolar e familiar.
ateliedeinteligencia@gmail.com

terça-feira, 6 de dezembro de 2011

Das algemas retiradas por Pinel , aos muros derrubados por Franco baságlia









Se infeliz ou não, cabe à interpretação de quem lê minhas ponderações feitas em relação à audiência pública realizada no auditório da Câmara Municipal de Goiânia, como intuito em debater o atendimento a saúde mental na nossa capital.

Em momento algum desferi criticas a psiquiatria, mas sim, a um modelo antigo e extremamente cruel que necessita ser lembrado para que na atualidade não venhamos incorrer na incoerência de práticas cerceiam e dilaceram o ser humano.

Quanto ao Instituto de Psiquiatria da USP, não resta dúvidas da qualidade científica que o mesmo, desde sua fundação na década de 1950,vem proporcionar a toda sociedade o direito a desfrutar de políticas avançadas e bem fundamentadas por parâmetros científicos. Essa instituição de ensino e pesquisa faz grande diferença entre o que é um hospital psiquiátrico e um manicômio. Isso é evidente e claro. No entanto, Goiás, não dispõem de uma estrutura como a USP, nem mesmo às universidades estaduais de nosso estado são feitos os mesmos repasses. Ao mesmo tempo, vale ressaltar que nossos médicos são sujeitos a honorários baixíssimos, agregados a uma elevada carga laboral desprovidos de condições adequadas de trabalho.

É, realmente, não estamos em São Paulo, e mesmo que estivéssemos, não é o Estado que faz a diferença, mas a seriedade do caráter científico e da eficiência das políticas públicas implantadas em conjunto a equipes multidisciplinares.
Sorocaba, que eu saiba, ainda está no estado de São Paulo, e em tal cidade, em menos de 3 anos , morreram 459 pessoas dentro dos manicômios; isso, nos anos de 2006 a 2009, registrando um índice de óbitos elevadíssimo, totalizando 16,5 para cada 100 leitos. Tais índices, estão muito acima dos existentes em São Paulo, que são de 6,5 para o mesmo número de leitos. Portanto, isso não é uma batalha ideológica, nem muito menos um revanchismo corporativista, porém, um grave fato. “Contra fatos, argumentos não contam”.

Felizmente, a reforma psiquiátrica, lei 10.216, vem estruturando redes substitutivas, sendo essas, amparadas pelos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), atualmente, mais de 1600 unidades; estruturação de leitos em hospitais gerais; os programas de volta para casa(que visam reintegrar socialmente pessoas acometidas de transtornos mentais, “egressas de longas internações, segundo critérios definidos pela lei 10.718, de 31 de julho de 2003”); das residências terapêuticas (locais de moradia destinadas a pessoas com transtornos mentais que permaneceram em longas internações e são impossibilitadas em retornar às suas famílias de origem).

Em relação ao envelhecimento da população brasileira, o mesmo se dá em decorrência da elevação da expectativa de vida do brasileiro, cujos motivos vão desde o desenvolvimento de técnicas médicas, recursos farmacológicos, das técnicas de outras ciências como a fisioterapia, psicologia, nutrição, educação física, agregados a pesquisas onde entram a sociologia e a filosofia.

A interdisciplinaridade constitui o campo que redefine uma nova postura em relação à compreensão do ser humano, ressaltando que as hierarquias são inerentes não da ordem de um saber, mas, posicionam-se de acordo com vicissitudes próprias a cada momento a ser analisado. Portanto, a terceira idade, não é objeto de uma disciplina, mas uma responsabilidade de todas.

Portanto, penso que pessoas acometidas por processos neuro-degenerativos, devem , ser tratadas em leitos dos hospitais gerais, ou de especialidades neurológicas, inseridas aos PSF (programas de saúde da família), atendendo o Estatuto do Idoso.
Em relação às pessoas em estado de vulnerabilidade social, ainda expostas de forma preconceituosa como “mendigos portadores de transtornos mentais”, devem receber todo suporte e tratamentos propostos pelas atuais políticas de saúde mental, não sendo a lei 10.216, responsável pela elevação dos mesmos, estarem “andando pelas ruas”. A todos é garantido o direito ao convívio social e todas prerrogativas constitucionais.

É notório, que a cádetra do um PhD , deva ser respeitada; entretanto, a sabedoria de quem se destaca por seus títulos, em momento algum, deve desmerecer os estudos interdisciplinares para a execução de políticas públicas que evidenciam-se em grandes avanços biopsicosociais; negá-las, seria um ato de incoerência , desconhecimento e , acima de tudo, uma má fé.

Generalizar posicionamentos empíricos a condutas políticas é um discurso construído com intuito em agregar apoio da opinião pública, sendo uma jogada bastante conhecida, porém , quando desconstruímos a fala e revelamos a o que pode estar por detrás da intencionalidade dos ataques a quem quer que seja, evidenciam-se os verdadeiros motivos de que a faz.

Não desejo ser ouvido e sequer reconhecido, aliás, tenho minha conduta pautada não nas bajulações, nem mesmo a revanchismos ideológicos, por isso não me disponho a apresentar pesquisas científicas em relação a eletro-convulso-terapia. Minha área de atuação e pesquisa vai muito mais além, sendo ela a psicologia e educação.
Então, é meu direito acreditar e defender o que acredito e , agora , se algumas convicções são tão frágeis, nada posso fazer a não ser sugerir um divã. O meu, faço bom uso como analisando.

Ao término, esclareço que nada tenho contra quem quer que seja, aliás, essa não é minha formação. Acredito no debate de idéias, no respeito às diferenças e na interdisciplinaridade como forma em constituirmos uma sociedade que não se esqueça das algemas retiradas por Pinel, nem mesmo derrubados pelo Psiquiatra Franco Basaglia.
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Marcus Fleury Junior - Psicólogo

sábado, 3 de dezembro de 2011

O que os filhos podem precisar...









Mais um ano se finda. Nele, mais e mais crianças, mesmo que não observemos, desenvolveram, no período transcorrido, conflitos emocionais que, se não conduzidos com atenção, irão, nos anos posteriores, comprometer, não apenas os processos cognitivos, mas, desencadear complexidades ansiogênicas que remeterão o estudante às complexidades próprias das alterações dos processos psicológicos. Sim, é hora em tratar as feridas, não as tornando um referencial de vida, mas, experiências que, acumuladas traduzam-se no contexto vivencial único e desprovido de duplicidade.
Bem canta e encanta o regionalista Almir Sater, quando em sua canção, nos faz lembrar que “cada um de nós compõe a sua história e cada ser em si carrega o dom de ser capaz e ser feliz...” Entretanto, há aqueles que, no decorrer de suas estradas, não compuseram o dom de serem felizes, mas, gritam por socorro em suas visíveis dores, medos, traumas e conflitos, ainda não socorridos.

Quantas são as crianças que estão dessa forma? Quantas não têm a mínima maturidade necessária para sequer resolver suas histórias e, ainda delas são exigidas que responsabilizem-se pelas imaturidades de adultos que dizem serem seus pais? Pais não transferem responsabilidades aos avós, tias, madrinhas, professores, escolas, nem tampouco, aos filhos. Todos são importantes e estruturam-se na interdependência do campo social, cada qual, estabelecendo suas contribuições, entretanto, a grande responsabilidade é sua, pai e mãe.

Aqui, não estamos aferindo se são bons ou não, apenas, lembrando das tarefas e responsabilidades que são próprias a cada um.

Então, caros pais, as férias não são apenas para o turismo, entretanto, um bom momento para que seus filhos consigam compreender o que lhes sucedeu no ano anterior, bem como, para que consigam se reestruturar em relação as possíveis perdas que tiveram, prevenindo assim, que a ansiedade não se torne um grande e difícil problema, mas algo que pode ser compreendido e resignificado, e com isso, resgatar a qualidade de vida e eficácia diante o desempenho daquilo que for próprio das etapas em que vivem.

É sugestivo que você chegue próximo ao seu filho ou filha e discuta com eles quais foram as dificuldades do ano que se passou, quais foram os melhores e os piores momentos, se alguns deles foram desencadeados por relações com colegas ou professores, se sentiram-se submetidos a situações constrangedoras(Bullying); se viram-se desamparados em relação a família e como foi isso?

Você pode e deve ajudar seu filho em relação ao controle da ansiedade. Para isso, é necessário que avalie se suas estratégias atuais como pais estão eficazes e, saibam sempre que, mudar é extremamente necessário e saudável para que as relações se aprimorem e estejam sempre prontas para novas etapas.

Nós pais, ao nos tornarmos inflexíveis, diante de um mundo extremamente dinâmico, com profundas e contínuas transformações, nos sujeitamos a ruptura em diversas partes, podendo, determinados fragmentos, fazerem falta na hora em recompormos as estruturas.

Quando valorizamos tais atenções preventivas em relação aos filhos, concedemos condições para que eles próprios saibam o que fazer em relação à ansiedade, pois, aprendem a pensar e não tornam-se inseguras em relação ao que necessitam enfrentar.
Desligue a TV por um tempo. Uma vez por semana, resgate a capacidade em sentir prazer em conversar com sua família, com seus filhos, permitindo que eles o conheçam e, ao mesmo tempo, você a eles.

Marcus Antonio Britto de Fleury Junior, Psicólogo e um dos coordenadores do Ateliê de Inteligência e do Programa preventivo e resignificativo, dirigido a crianças e adolescentes no cotidiano escolar e familiar.
ateliedeinteligencia@gmail.com