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sábado, 24 de setembro de 2011

David, o anjo que queria voar








Ser quieto, tirar boas notas e ser educado. O que pode estar por traz de tais características? Isso, o pequeno David, de 10 anos de idade, poderia ter nos ajudado muito a compreender, caso a escola em que estudava, na cidade de São Caetano do Sul, tivesse um programa que acompanha os alunos em seus desenvolvimentos e conflitos psicoafetivos.

Tais projetos aos serem implantados nas escolas, trazem a oportunidade em conhecer todos os alunos, suas famílias e suas realidades biopsicosociais promovendo, se necessário, intervenções terapêuticas individuais e no grupo, sendo nesse último, através das oficinas de criatividade. O propósito é trabalhar as fragilidades e demandas encontradas nas relações entre os alunos, professores e pais, estabelecendo um novo significado, um novo olhar, proporcionando, dessa maneira, a resiliência: processo onde o terapeutizando ou o grupo torna-se apto a lidar com as adversidades inerentes ao conjunto de circunstâncias desencadeadas por elevados níveis de estresse e ansiedade, e, ao final, consiga estruturar-se, através de novos significados em relação ao que o incomodava.

David, o garoto de São Caetano do Sul, era apenas um anjo que desejava voar. Queria estar acima do inferno social criado pelos homens, cujos modelos padronizados de comportamentos, refutam a diversidade, como se a mesma fosse uma grave doença. Era uma criança quieta, calada. E que mal há nisso, quando tais comportamentos apresentam-se como características de personalidade? Nenhum!

Mas, a sociedade “big brother”, movida por seus giga-bites, requer estigmatizar, adoecer e transformar o diferente naquilo que deve ser execrado e lançado a margem do contexto social, para que um grupo de pessoas possa transferir suas perversidades, e então, utilizam-se dos mecanismos, hoje justificados como Bullying, e assim, não estarão sozinhos no teatro social dos horrores.

As escolas, como espaço social, necessitam de um novo olhar, pois, agregam uma diversidade muito grande de atores sociais, sendo que, esses estabelecem processos de identificação uns em relação aos outros, desenvolvendo aí, a formação de grupos; porém, muitas crianças, em virtude de determinadas características, isolam-se, “não por serem isso ou aquilo, assim, ou assado”. Então, faz-se necessário que as instituições de ensino promovam trabalhos cuja multidisciplinaridade faça-se envolvida, desenvolvendo projetos que visem garantir segurança física e psicológica aos estudantes.

Estamos, a um bom tempo, falando do “programa de prevenção a depressão e outros transtornos’. Entretanto, tais programas, não dão a visibilidade do asfalto, das praças, nem tampouco, mostra-se como um “negócio da China”. Motivo esse para que não sejam implantados. Então, enquanto os senhores políticos enchem-se de vaidades, nossas crianças cometem suicídio na frente dos coleguinhas.

É necessário que as crianças não sejam um número nas escolas, mas, sim, que sejam conhecidas, que tenham histórias e que seus perfis psicológicos possam ser avaliados com o objetivo em acompanhá-las nos processos de desenvolvimento psicoafetivos, para que, ao primeiro sinal de alerta, ou, primeiro pedido de apoio, possam ser amparadas em suas fragilidades, em suas estruturas de risco, bem como, serem estimuladas em suas estruturas potenciais. Isso redundará em auto-estima, respeito às diferenças, a solidariedade e a proximidade, para que juntos possam promover uma grande diferença, não ao futuro que é incerto, mas, ao presente em que vivem.

Marcus Antonio Britto de Fleury Junior é psicólogo e um dos coordenadores do Ateliê de Inteligência.
atelidedeinteligencia@gmail.com

sábado, 17 de setembro de 2011

O amor não é exigência para a felicidade




A hipocrisia das conceituações do sentimento de amor faz da possibilidade em vivê-lo, muitas vezes, o contrário daquilo que as pessoas tanto procuram, levando-as ao mais intenso desespero, tal como, inocentes que estão lançados ao fundo das mais inóspitas prisões. Assim, a escuridão, nada mais é, senão, a ausência que impomos a nós mesmos; o auto-abandono que estruturamos às nossas vidas por um dia acreditarmos que alguém seja o responsável em trazer o que somente nós podemos buscar.

Quantos são os que esperam que o padrão religioso do amor, ou mesmo, comercial, ou então, as meras convenções sociais, venham lhes trazer algo que é de plena responsabilidade pessoal. O amor é pessoal e intransferível. Não pode ser atribuído, a quem quer que seja, como uma responsabilidade a ser desempenhada pelo outro, como nas inúmeras sensações em nossos corpos. Isso não é amor, mas sim, sensações, tesão e outras formas de estimulações, que logo mais, se não houver auto-estima e um Eu sempre pronto a reformular os capítulos de nossas histórias de vida, passarão, deixando para trás, apenas as lembranças que nos cobram, não apenas de nossas mentes, mas, de inúmeras pessoas. Lembranças daquilo que não mais existe, ou mesmo, do que está esquecido e fôra investido numa única vez, como se a existência fosse assim, tão limitada e terrivelmente miserável.

O que chamam de “amor”, nessa sociedade que nada é de moderna, ao contrário, um grande atraso, cheia de objetos que levam essas coisinhas de duas pernas, intitulados de seres humanos, a serem tão desumanos, é justamente as conceituações estabelecidas ao tesão mal elaborado, que mais cedo ou mais tarde, chamarão de “amor”. Por isso, os finais dessas histórias que começam elevadamente celebradas, e poucas vezes bem elaboradas, terminam em célebres enredos de tragédias e destruições. Quantas são as pessoas que, pela ausência de si mesmos, ao permitirem-se anular em nome das exigências que satisfazem as expectativas de alguém, estão hoje lançados aos estigmas, justamente, por terem frustrado aqueles que nunca encontraram-se?

O amor não é exigência para a felicidade, ao contrário, existem pessoas que, em seus momentos de solidão, contemplam o regozijar-se do estar só, expondo o contentamento com o que são e com o que vivem, e assim, sabem muito bem que podem sempre ir muito mais além em suas vidas, sem a sujeição ao egoísmo, ou, ao adoecer coletivo dos que buscam sentimentos nos outros sem que ao menos saibam o papel que os mesmos representam em suas próprias vidas.

Há casais que se destroem uns aos outros responsabilizando uma das partes pelas frustrações quanto as expectativas que transferem. Há amizades que já nascem adoecidas por acreditar que uns completam os outros. E há uma sociedade que está a séculos na “UTI”, padecendo pela inobservância quanto a grandiosidade da vida e, não pela limitação da mesma a uma bula repleta de contra-indicações que muitos fazem de conta desconhecer.

Aos poucos, compreendemos que não podemos corresponder às expectativas de quem quer que seja, por mais que tenhamos profundos níveis de convivência. Isso, não limita a felicidade que podemos viver, nem tampouco, a completitude que nos faz sentir prazer, mas, amplia nossa condição quanto a compreensão ao papel do amor em cada um de nós, desde que saibamos da importância desse sentimento que cultivamos.

Sou conhecedor da beleza existente nas mais belas flores, mas, não exercitarei o egoísmo próprio dos que adornam seus altares arrancando-as dos jardins, pois assim, meus olhos vêem e meus sentimentos se renovam, aprendendo que o amor não é o que tomamos como posse, mas o que consolidamos em nós mesmos, como um doce remanso para que compreendamos o grande valor e intenso prazer que há em existir.

Marcus Antonio Britto de Fleury Junior é psicólogo e um dos coordenadores do Ateliê de Inteligência.
ateliedeinteligencia@gmail.com